Thursday, November 03, 2011

Estou demasiado presa à terra. Demasiado séria, demasiado quotidiana, demasiado triste. Nada me espanta a alma e nada me faz querer bater a porta de casa em busca de algo que não seja tão mundano, não seja tão eu. Nada me faz querer quebrar o feitiço que a televisão me lançou e nada me grita para que sossegue o meu inconsciente de que a cada dia que passa dou um passo para incapacitar cada vez mais uma miúda de 19 anos e o seu talento para viver.
Não sei quem sou mas tirei-lhe as folhas e as canetas a quem ela se confessava e com quem ela confiava dia sim dia não, tirei-lhe o alento de viver e a fome de dominar o mundo, a natureza e as pessoas.

Na maior parte das vezes esqueço-me que alimento outro corpo e enveneno outra alma, sei que cá não pertenço mas não vislumbro a saída ou a alternativa.
Mas às vezes, acordo-a, ela estremunhada,
esteve adormecida, anestesiada,
consciência dormente,
coração já não quente,
fragmentada em pedaços,
já perdida, não sabe regressar aos seus passos,
não tem noção do tempo nem do espaço.
Sabe-se desaproveitada,
e vê-se espelhada
num verdadeiro fracasso,
um erro crasso,
o sapato da cinderela,
a arte sem uma tela,
a cura de uma doença,
um criminoso sem sentença,
algo precioso mas sem reconhecimento,
um furacão sem vento,
um desperdiçado talento,
um diamante em bruto,
um inteligente mas inculto.
Meio talento, meio nada,
meio pó, meio pó-de-fada,
meia lágrima na almofada,
que sabe que algo se perdeu mas não sabe o quê.
Perdi metade de mim,
já só restam as folhas do jardim,
e secas, sem encanto assim.
Pretendo ter volta a dar mas a volta é dada a mim,
e o pior é que é dada por mim mesma,
e depois de escrita uma resma,
prometo que tentei de tudo para regressar a mim,
à sonhadora sem fim,
à criadora do que quiser,
à criança virada mulher.

Volto à irresponsável, mas sobretudo V I V A , eu.

2 comments:

rodolfo freitas said...

que texto lindo. impossível não se identificar. muitos parabéns, fico feliz por sermos seguidores:)

June said...

nós não parecemos jovens, pois não? Parecemos uns automatos ou assim. Digo isto porque tambem tenho 19 anos e sinto que ando aqui so a ver os dia passar. Não faço nada de útil, não consigo arranjar trabalho e portanto não tenho dinheiro para me orientar nem me apetece ir para a faculdade... Não estou bem em casa nem fora dela, não estou bem aqui nem fora daqui. O que é que nos aconteceu? De todas as maneiras, texto muito bonito :)

Um beijinho *